Morador do Rio de Janeiro desde 2002, Vincent Rosenblatt é o autor do livro com 200 páginas que mostram bailes organizados em todas as regiões da cidade. O lançamento da obra acontece nesta quinta-feira (28), na Aliança Francesa de Botafogo, na Zona Sul, às 18h30.
O fotógrafo francês Vincent Rosenblatt vai lançar nesta quinta-feira (28), na Aliança Francesa de Botafogo, na Zona Sul, às 18h30, o livro ‘Rio Baile Funk‘.
A obra retrata cenários e personagens do movimento cultural mais popular do Rio de Janeiro ao longo dos últimos 17 anos. Em 200 páginas, o livro mostra imagens do mundo do funk carioca e suas principais festas, nos quatro cantos da cidade.
“O livro é uma experiência. Ele foi pensado como uma partitura, com imagens em sequência. Como se o leitor fosse atravessar uma noite de funk, mas uma noite de fragmentos desses 17 anos de bailes. As fotos se comunicam”, explicou o fotógrafo Vincent Rosenblatt.
No livro ‘Rio Baile Funk’ muitas imagens conseguiram capturar a energia de festas grandiosas, como os bailes da Árvore Seca, do Castelo das Pedras, do Boqueirão, da Chatuba, do Cantagalo e muitos outros.
Para montar o livro, Vincent disse ter fotografado mais de 400 bailes no Rio de Janeiro. “Bem mais”, segundo ele.
“Não é meu papel explicar o funk ou convencer quem não consegue enxergar a beleza do seu próprio povo ou da sua própria cultura. (…) O livro mostra a valorização da juventude negra brasileira, da luta contra o racismo, contra a homofobia. (…) A verdade do Rio está nessa música”, comentou Vincent.
Para o artista, o livro não é sobre a história do funk e nem sobre os seus mais famosos protagonistas. Rosenblatt preferiu registrar as emoções, os movimentos e as cores que ditam o ritmo funk.
Funk pela janela de casa
Em entrevista ao g1, Vincent contou que o primeiro contato com funk carioca surgiu através da janela de sua casa, em Santa Teresa. Foi lá que o fotógrafo ouviu as músicas do baile local e não resistiu.
“O baile fazia as paredes da minha casa tremerem. As letras eram muito fascinantes. Seja o funk proibidão, putaria ou o funk consciência. Pela primeira vez, a música falava da realidade do carioca. Eu podia vivenciar o Rio de Janeiro que os meus alunos me passavam”, contou.
Antes de começar a fotografar os bailes, Vincent desenvolveu o projeto “Olhares do Morro”, que, entre 2002 e 2008, descobriu fotógrafos na favela Santa Marta, em Botafogo, na Zona Sul do Rio. Foram esses alunos que contaram sobre os bailes para o professor.
“Pra mim foi um choque e eu passei a entender que a verdade do Rio estava nessa música e não na música exportação da época. Eu passei a comprar CDs de funk e um deles, muito importante, foi ‘O Fiel’ do Mr. Catra. Eram letras fortes. E eu não me aguentei”, disse.
Vincent lembrou do dia que decidiu pegar um taxi até o baile do Castelo das Pedras, em Rio das Pedras, uma comunidade da Zona Oeste. No local, ele conversou com um produtor do evento e pediu para fotografar o baile.
“Era um grande baile na Zona Oeste e não achei que tivesse chance de fotografar lá. Mas quando eu adentrei o baile eu tive uma epifania. Aquilo era muito mais que entretenimento. A energia, a força daquilo era enorme. Não era como uma boate na Barra, era muito forte. Naquele momento, eu soube que teria anos de trabalho pela frente”, relembrou.
Obra coletiva
Segundo o fotógrafo francês, o livro ‘Rio Baile Funk’ só foi possível por conta das relações que ele construiu com os personagens do funk carioca, como DJs, MCs, produtores culturais, dançarinos e frequentadores.
Um dos primeiros amigos de Vincent na cena funk foi o produtor Reginaldo Hermínio, da equipe de som CurtisomRio. Ele era o responsável por promover o Baile do Boqueirão, no Centro do Rio.
Vincent lembrou que um dos ensinamentos mais valiosos para quem pretendia fotografar a alma do funk carioca era não oferecer risco para a realização dos bailes.
“Era importante que a fotografia não colocasse em risco os frequentadores ou a própria realização do baile”.
Diferente do que muitas pessoas podem imaginar, a ideia de fotografar os bailes não era produzir um documentário sobre as comunidades ou seus moradores. Vincent não estava preocupado em mostrar o crime organizado ou armas de fogo. O objetivo era fugir do óbvio, mas sem revelar aquilo que não pudesse ser visto.
“A minha fotografia não era uma denúncia e não era para a imprensa, que queria mostrar os problemas das comunidades. As minhas fotos não poderiam ser um motivo para a polícia acabar com o baile”, explicou.
E foi com a grande explosão do trabalho feito no baile do Boqueirão, onde ele acabou contratado pela produção do evento, que Vincent conheceu dezenas de celebridades dos bailes. Foram esses amigos que se arriscaram para levar o olhar daquele francês para o interior de comunidades que, para muitos, eram sinônimo de violência e terror.
“Os dançarinos, DJs, MCs e produtores me convidaram para os bailes de onde eles eram cria. E eles arriscaram um pouco o seu conceito de cria por mim. Não me conheciam e me davam confiança para fotografar nesses lugares aonde a imprensa não vai, onde existe um bloqueio”, comentou.
Outro nome importante para o trabalho de Vincent no Rio foi do DJ Pernalonga, responsável pelo Baile da Arvore Seca, no Complexo do Lins, na Zona Norte.
Pernalonga morreu em 2017 e deixou muitas marcas positivas na vida de Vincent, que fez questão de colocar uma foto do amigo no livro que conta sobre os bailes cariocas.
“Ele foi o primeiro de uma longa lista de funkeiros que arriscaram a vida para me permitir fotografar. Colocava em jogo a vida sim, pois, se algo der errado, ele seria o primeiro cobrado. (…) Inúmeras vezes, me localizando no meio da multidão no Baile, oficializava no microfone a minha presença e e validava. Olhava de longe quando alguém armado inventava algum câo comigo e já cortava com a sua autoridade nata”, escreveu Vincent em um post em homenagem a Pernalonga.
“Graça à ele, comecei a minha jornada de uma década nos bailes de favela. Depois da ousadia dele, outros DJ’s, MC’s, dançarinos tomaram essa mesma coragem e generosidade e me convidaram nas suas favelas e bailes, querendo ter o mesmo tipo de registros fotográficos que bombavam na Internet da época”, completou o fotógrafo.
Para a tristeza de Vincent, o Funk ainda é pouco valorizado como cultura no Rio de Janeiro. O fotógrafo lembra que ao mesmo tempo que o movimento foi reconhecido como Patrimônio Cultural do Estado, ele segue sofrendo com a repressão desse mesmo Estado.
“A esquizofrenia no Brasil é que de um lado a gente tem um reconhecimento do funk como patrimônio cultural pela Alerj. E no mesmo tempo a gente nunca teve tanta repressão aos bailes. Enquanto a Secretaria de Cultura incentiva os bailes, as UPPs não deixam os bailes renascerem”, reflete o fotógrafo.
Além dos bailes que seguem como resistência em suas comunidades, uma opção para quem curte funk atualmente no Rio de Janeiro são as festas pretas, como Batekoo, Yolo Love Party e outras. Na opinião de Vincent, esses espaços conseguem promover a celebração da identidade carioca e da diversidade, sem discriminação. São festas seguras para viver a magia dos bailes dos anos 2000.
“Muitos jovens cresceram sem ter acesso a seu lazer mínimo, sem ter essa opção. Hoje estão novamente rolando, mas sem a cena dos anos 2000. Eram tantos bailes legais que você não sabia para onde ir. Hoje eles estão retomando.
Serviço:
- Lançamento Rio Baile Funk
- De: Vincent Rosenblatt
- Editora: {Lp} press
- 200 páginas – capa dura
- Dia: 28 de julho de 2022
- Horário: às 18h30
- Aliança Francesa de Botafogo
- Rua Muniz Barreto, 746 – Botafogo
Além do lançamento do livro, Vincent também está com suas fotos expostas na Galeria da Aliança Francesa Botafogo.